2 de ago. de 2010

Pela noite - Caio Fernando Abreu

“Talvez esse seja o problema, uma vida sem manhãs. Estranho é que não escolhi. Não consigo precisar o momento em que escolhi. Nem isso, nem qualquer outra coisa, nem nada. Foram me arrastando. Não houve aquele momento em que você pode decidir se vai em frente, se vai atrás, se vira á esquerda ou à direita. Se houve, eu não me lembro. Tenho a impressão de que a vida, as coisas foram me levando. Levando em frente, levando embora, levando aos trancos, de qualquer jeito. Sem se importarem se eu não queria mais ir. Agora olho em volta e não tenho certeza se gostaria de estar aqui. Só sei que dentro de mim tem uma coisa pronta, esperando acontecer. O problema é que essa coisa talvez dependa de outra pessoa para começar a acontecer.
- Toque nela com cuidado - disse Santiago. - Se não ela foge.
- A coisa ou a pessoa?
- As duas.”